quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

I Domingo Quaresma B


Naquele tempo, o Espírito Santo impeliu Jesus para o deserto. Jesus esteve no deserto quarenta dias e era tentado por Satanás. Vivia com os animais selvagens e os Anjos serviam-n’O. Depois de João ter sido preso, Jesus partiu para a Galileia e começou a pregar o Evangelho, dizendo: «Cumpriu-se o tempo e está próximo o reino de Deus. Arrependei-vos e acreditai no Evangelho». (Mc 1,12-15)

Caros amigos e amigas, este Evangelho é um condensado de toda a história da salvação, de toda a aventura da humanidade e da nossa história pessoal. No início deste “tempo favorável” Deus volta a escolher o deserto para nos convidar a um (re)encontro… com Ele.

Deixar-se conduzir ao deserto
Aparentemente onde não há nada nem ninguém está, no entanto, Deus. Ali, onde tudo foge e tudo falta, pode-se ainda viver de fé e experimentar o amor divino! Se, por um lado, o deserto é símbolo de vazio, sede e fome, renúncia de comodidades, por outro lado, ali Deus patenteia-nos uma liberdade desmesurada capaz de nos abrir, um silêncio amplo que permite a escuta, uma luz que desmascara as trevas, uma solidão apta a um encontro… o sair de um mundo para chegar ao coração do mundo, ali onde se encontra Deus. Mas, como Jesus, precisamos de um coração dócil para nos deixar conduzir…
Como a Adão, o pecado faz-nos temer a nudez e a exposição perante a voz de Deus, mas é precisamente a nudez do deserto que nos ajuda a reencontrar o Éden que parecia perdido e o timbre da voz de Deus que nos recria. É ali que aprendemos o abandono da fé, a entrega de toda a vida nas mãos de Deus. É ali, distantes dos caminhos já percorridos, que reaprendemos a viver com a própria humanidade, que reaprendemos a caminhar, ao descobrir que só Ele é a terra prometida.

Viver entre feras e anjos
É uma expressão que toca a nossa realidade existencial, o clássico dualismo que nos parece perseguir, extremar e despedaçar. Porém Jesus mostra-nos que esta realidade, mais do que consumar-se em destino, nos brinda a uma escolha. E esta escolha depende da nossa atitude e do nosso olhar.
Como os outros evangelistas sinóticos, Marcos não nos apresenta o cortejo das tentações, mas um vislumbre em que, antecipadamente, nos apercebemos de todo o drama que se desenvolverá nos três anos da vida pública de Jesus e se concluirá na conspiração dos chefes do povo, na traição de Judas, no abandono dos discípulos e na morte de cruz.
É no deserto que Jesus escolhe qual o rosto de Deus a anunciar: aquele fácil Deus, patrão e polícia, ou o impossível Deus, servo e apaixonado da cruz? Escolhe também qual o rosto do homem a seguir: o do rival ou o do irmão? É desta escolha que explode o feliz anúncio: “está próximo o reino de Deus”!

Arrependei-vos e acreditai no Evangelho
Parece que Jesus nos dá uma ordem. E, no entanto, faz-nos um convite, dirige-nos uma oração. Não nos pede obediência, mas oferece-nos uma oportunidade. E sentimos a doçura desta oração e o feliz convite: “Mesmo quando tudo te parece deserto, quando os rostos parecem feras, quando te sentes pecado, Deus está aqui e cura a tua vida. Deus está contigo, com amor: confia e recomeça do amor”.
Deus ama-nos tal como somos, e nada está perdido definitivamente para Ele, como o proclamará a noite de Páscoa: “Feliz culpa, que mereceu ter assim um grande Redentor”!
Passando pelo deserto, Jesus deixa a sua marca nos nossos desertos: nunca mais estaremos sós. Como não acreditar?! Em qualquer dificuldade ou solidão, podemos reconhecer as pegadas dos seus passos, os vestígios da sua presença, o reflexo do seu rosto a abrir-se para nós em doce Evangelho!

VIVER A PALAVRA
Neste tempo da Quaresma quero arriscar a entrar no deserto para me deixar recriar por Deus.

REZAR A PALAVRA
Senhor, na correria da vida, onde o relógio dita as regras do tempo,
o Teu tempo é paragem dinâmica, viagem no deserto, descoberta de um sim...
é a força do Espírito que transforma o meu tempo em caminho de conversão
e me lança no deserto das escolhas, na arena da tentação...
É aí que me propões o amor como estrada, meta e fonte...
É aí que me convidas a acreditar na Palavra que me recria...
Porque estás próximo e não me deixas sozinho neste deserto!

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