Naquele tempo, João disse a
Jesus: «Mestre, nós vimos um homem a expulsar os demónios em teu nome e
procurámos impedir-lho, porque ele não anda connosco». Jesus respondeu: «Não o
proibais; porque ninguém pode fazer um milagre em meu nome e depois dizer mal
de Mim. Quem não é contra nós é por nós. Quem vos der a beber um copo de água,
por serdes de Cristo, em verdade vos digo que não perderá a sua recompensa. Se
alguém escandalizar algum destes pequeninos que crêem em Mim, melhor seria para
ele que lhe atassem ao pescoço uma dessas mós movidas por um jumento e o
lançassem ao mar. Se a tua mão é para ti ocasião de escândalo, corta-a; porque
é melhor entrar mutilado na vida do que ter as duas mãos e ir para a Geena, para
esse fogo que não se apaga. E se o teu pé é para ti ocasião de escândalo,
corta-o; porque é melhor entrar coxo na vida do que ter os dois pés e ser
lançado na Geena. E se um dos teus olhos é para ti ocasião de escândalo, deita-o
fora; porque é melhor entrar no reino de Deus só com um dos olhos do que ter os
dois olhos e ser lançado na Geena, onde o verme não morre e o fogo nunca se
apaga».
Caros amigos e amigas, Jesus não
se compadece dos nossos preconceitos, que redundam numa escandalosa falta de
acolhimento. Faz-nos ver quão livre e libertador é o bem!
Não ser estorvos
para o bem
Parecia
que João levava uma brilhante “folha de serviço”, guarnecida com esta
demonstração de zelo em relação aos “direitos de autor” de Jesus e, diante das
palavras do Mestre, fica com o entusiasmo cristalizado na garganta. A resposta
de Jesus continua a ser para nós que ousamos definir quem é ou não digno de
usar o seu nome como caminho para libertar e para fazer o bem; é para nós que
apontamos levianamente um dedo sujo de preconceitos; é para nós que pugnamos
por um monopólio sobre o nome e sobre a pessoa de Jesus. É bem real a tentação
de instrumentalizar Deus, de usa-l’O e geri-l’O com os nossos cálculos
tacanhos, de transformar a nossa fé num sectarismo intolerante, pejado de
restrições e manuais de procedimentos.
Admira-nos
este Jesus que diz “quem não é contra nós
é por nós”! Ficamos perplexos com este, aparentemente frágil, ligeiro e
fácil, critério de ingresso no seu amor! Que libertador é o Mestre do amor que
tem sempre um caminho estendido para quem O procure! Para Ele basta uma fenda aberta,
por onde possa infiltrar-se a força renovadora do seu Amor porque, essa sim, é
a moção mais forte e decisiva para o bem…
Se
alguém escandalizar
Jesus
demonstra-nos que, no fundo, tudo se resume a uma questão de acolhimento. Estas
sentenças atingem um teor de extrema dureza, Ele quer fazer-nos notar como é
grave a falta de acolhimento para com o outro, a loucura de querermos domar o
Espírito que “sopra onde quer”.
Este
Evangelho desmascara a nossa atitude capitalista sobre o bem, que se baseia
naquela mentalidade em que um soma e
segue e em que o mais frágil é deixado à mercê da sua fragilidade. Jesus confia
à nossa solicitude a fragilidade do outro. E não vamos a lado nenhum se vamos
sós. É aqui que reside o segredo da comunhão, é o mistério da comunhão da Trindade,
o milagre em que Deus nos faz participantes da Sua Vida e tanto nos valoriza,
apesar da nossa miséria.
Cortar o mal pela
raiz
O
egoísmo é tão subtil perante a nossa natureza, atreita ao pecado! Sem uma disciplinada
vigilância, o mal depressa se nos cola ao ser, de modo que parece ficar a fazer
parte dos nossos membros, com tal à vontade que os subjuga. Corremos o risco de
nem distinguirmos qual é a parte sã e a parte doente da nossa vida. Jesus convida-nos
a fazer um diagnóstico muito sério e aponta-nos um critério infalível: uma
ocasião de escândalo é sintoma certo de doença! Ele adverte-nos para o perigo
que constitui na nossa vida aquele membro que foi tomado pela gangrena do
egoísmo: a única solução é mesmo a amputação, a cirurgia radical. E isso
mete-nos medo… medo de (nos) perder. Mas o que Jesus enfatiza não é a perda, é
a verdadeira Vida! Ele não quer que continuemos a iludir-nos com uma vida preservada,
mas podre, inútil, a fluir para o vazio.
Amigos e
amigas, não tenhamos medo de cortar o que é inútil e pernicioso para viver a
vida de Deus. Ainda que tenhamos de sangrar, as chagas de Jesus, abertas na
cruz, asseguram-nos a transfusão de um amor que nos cura, a Vida nova que nos garante
a cicatrização da alegria. Precisamos de fazer uma revisão constante ao nosso
coração para que ele deixe passar, sem o contaminar, o salutar caudal do
Evangelho.
VIVER
A PALAVRA
Vou
identificar o quem em mim é ocasião de escândalo e precisa ser lançado fora.
REZAR A PALAVRA
Senhor, na estrada do meu livro, vejo milagres, descubro sinais,
desvendo a Tua presença no mistério de cada irmão e de cada
gesto de bem.
Mas há em mim ramos secos, inúteis, que não bebem da tua
frescura.
Há em mim páginas vazias de amor e de paz, que não falam de ti.
Há em mim ocasiões de escândalo que me afastam da tua verdade.
Corta, deita fora, arranca os meus excessos, pois só tu és o
necessário!