Naquele tempo, Jesus deixou de
novo a região de Tiro e, passando por Sidónia, veio para o mar da Galileia, atravessando
o território da Decápole. Trouxeram-Lhe então um surdo que mal podia falar e
suplicaram-Lhe que impusesse as mãos sobre ele. Jesus, afastando-Se com ele da
multidão, meteu-lhe os dedos nos ouvidos e com saliva tocou-lhe a língua. Depois,
erguendo os olhos ao Céu, suspirou e disse-lhe: «Effathá», que quer dizer
«Abre-te». Imediatamente se abriram os ouvidos do homem, soltou-se-lhe a prisão
da língua e começou a falar correctamente. Jesus recomendou que não contassem
nada a ninguém. Mas, quanto mais lho recomendava, tanto mais intensamente eles
o apregoavam. Cheios de assombro, diziam: «Tudo o que faz é admirável: faz que
os surdos oiçam e que os mudos falem».
Caros amigos e amigas, esta
belíssima cena, passada num território hostil, está cheia de silêncio e de
sentidos face à Palavra: ouvidos, língua… dedos. Tudo se prepara para a escuta
e para a revelação. O discurso é feito pelas mãos de Jesus e por uma pequenina
palavra “Effathá”: é a eloquência de um princípio!
Um
surdo que mal podia falar
No drama
deste homem poderia reconhecer-se cada um de nós. A surdez implica a
incapacidade de ouvir, mas também de falar. E a
incapacidade de comunicar é demolidora, porque a comunicação está no centro da
nossa definição como seres humanos, capazes de relações. Não podemos falar de Deus se antes
não tivemos ouvidos para a força de tantos sinais que O anunciam e descrevem. Não
temos Palavra, se não formos fecundados pelo seu Verbo revelador, não teremos
melodias para cantar as suas maravilhas se não tivermos sido embalados pela serenata
do seu amor. O mundo está cheio de palavras vazias, de falas indecifráveis, de
verbos venenosos, de sons mortíferos… na proporção em que está carente de
ouvidos abertos à Palavra Criadora que o plenifica.
Os dedos e o
coração do divino oleiro
Este
texto está repassado da ternura de Deus... Primeiro Jesus separa o homem da
multidão. Nós não somos multidão. O seu amor tem este detalhe de atenção: Ele
retira-nos, escolhe-nos, elege-nos. Somos especiais aos seus olhos, únicos de
valor ao seu coração.
A seguir
entram em cena as mãos de Jesus. Como não recordar a imagem que nos dá o livro
do Génesis, quando Deus engendra e molda a matéria com a sua própria Vida? Como
não recordar também o nosso baptismo quando a água, a unção e a Palavra nos inauguram
uma caminhada na fé, que nos leva directamente até ao seu amor? Jesus toma a
obra do Pai nas suas mãos. Vede, amigos e amigas, em que mãos está aconchegada a
vida deste homem, em que mãos poderá confiar a nossa insuficiência, o nosso
pecado, os nossos medos, a nossa fragilidade, quando lhe entregamos a vida! Os
ouvidos do surdo eclodem ao toque dos dedos do artífice do universo e a sua
língua desprende-se do cativeiro da mudez, com a gota de saliva d’Aquele que é
a Palavra. Não é a única vez que este médico único usa semelhantes remédios.
São remédios que Jesus encontra no mais íntimo de si. Deus cura-nos com a sua
própria vida; já assim nos tinha criado.
Effathá com um suspiro
A palavra
Effathá é precedida de um suspiro. Um suspiro é um extravasar de um conteúdo
interior. Jesus convoca a Vida desde o íntimo de si próprio, para presentear
este carente de vida. Nós somos constantemente objectos dos suspiros de Deus,
dessa exalação da sua Vida para a nossa sede de vida. Deus expira para insuflar
em nós o seu sopro, desde o momento da criação até ao expirar de Jesus na Cruz.
E depois
vem esta palavrinha, pequena e frágil, a transportar a força do amor que cura.
Como se viesse afiada, palavra que nos perfura a rotina e nos lanceta a alma; que
nos descerra um cenário e nos lança num caminho. O caminhar alimenta-se de
aberturas sucessivas. A esperança conhece bem esta palavra. O Deus que infinitamente
nos ama tem o poder de abrir o espectáculo da nossa vida, de inaugurar
oportunidades, de rasgar caminhos. Em cada dia Ele fende a noite para nos
descerrar a luz, golpeia o coração para nos alimentar de amor. Ele abre as
nossas possibilidades, deixando-nos no horizonte a beleza infinita da sua
perfeição.
Este
homem foi trazido por outros e agora o seu canto é coral. Deus permite que o
caudal do seu amor passe pelas nossas vidas, rumo àqueles que ama. Amigos e
amigas, aceitemos este desafio de mediadores do amor de Deus, deixando que,
através de nós, flua o milagre, sempre surpreendente, do seu Evangelho!
VIVER
A PALAVRA
Vou
deixar que a vida e a palavra de Deus fecundem as minhas possibilidades.
REZAR A PALAVRA
Senhor,que trilhas o caminho da descoberta e transportas a
novidade da vida,
toca-me, para que eu estremeça ao som da brisa do teu abraço que
é convite.
Abre-me à harmoniosa candura da Tua Palavra, ao segredo do teu
suspiro,
para que acolha, livremente, a maravilha do milagre que me transforma!
Abre-me ao silêncio do teu cantar dentro de mim, à força do teu
olhar,
para contemplar a luz da tua presença que me envia e me faz de
novo!
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