sexta-feira, 1 de abril de 2011

IV Domingo Quaresma A


Naquele tempo, Jesus encontrou no seu caminho um cego de nascença. Cuspiu em terra, fez com a saliva um pouco de lodo e ungiu os olhos do cego. Depois disse-lhe: «Vai lavar-te à piscina de Siloé»; Siloé quer dizer «Enviado». Ele foi, lavou-se e começou a ver. Entretanto, perguntavam os vizinhos e os que o viam a mendigar: «Não é este o que costumava estar sentado a pedir esmola?». Uns diziam: «É ele». Outros afirmavam: «Não é. É parecido com ele». Mas ele próprio dizia: «Sou eu». Levaram aos fariseus o que tinha sido cego. Era sábado esse dia em que Jesus fizera lodo e lhe tinha aberto os olhos. Por isso, os fariseus perguntaram ao homem como tinha recuperado a vista. Ele declarou-lhes: «Jesus pôs-me lodo nos olhos; depois fui lavar-me e agora vejo». Diziam alguns dos fariseus: «Esse homem não vem de Deus, porque não guarda o sábado». Outros observavam: «Como pode um pecador fazer tais milagres?». E havia desacordo entre eles. Perguntaram então novamente ao cego: «Tu que dizes d’Aquele que te deu a vista?». O homem respondeu: «É um profeta». Replicaram-lhe então eles: «Tu nasceste inteiramente em pecado e pretendes ensinar-nos?». E expulsaram-no. Jesus soube que o tinham expulsado e, encontrando-o, disse-lhe: «Tu acreditas no Filho do homem?». Ele respondeu-Lhe: «Quem é, Senhor, para que eu acredite n'Ele?». Disse-lhe Jesus: «Já O viste: é quem está a falar contigo». O homem prostrou-se diante de Jesus e exclamou: «Eu creio, Senhor». (Jo 9, 1.6-9.13-17.34-38)


Jesus numa aventura de amor aproxima-se de um cego, sussurra-lhe uma ordem e oferece-lhe a sua luz. O episódio narrado pelo Evangelho é também o reflexo da humanidade mergulhada na noite, quando não vê o aproximar-se de Deus, quando se entretém em questões sem significado e quando é incapaz de se encantar com os milagres realizados.


“Jesus encontrou um cego de nascença”

Jesus parece ser o único que vê o cego marginalizado. Se o homem olha só com os olhos para as aparências, Deus olha com o coração para ver o coração. O olhar é uma questão de direcção e de intensidade. E Deus vê misericordiosamente além da superfície. Não é o homem que procura e vê Deus; é a Luz que nos procura e se avizinha; é Deus que nos contempla amorosamente, sonhando para todos uma luz esplendorosa. E quando encontra as trevas, o Mestre inicia uma liturgia de vida e repete, no rosto dos cegos, os gestos da criação de um Deus atento a recriar o homem. O céu de Deus continua ainda hoje a amassar-se com a nossa terra, e as mãos do oleiro acariciam as nossas cinzas, semeando nelas o fulgor da sua luz.


A visão de um cego

O cego de nascença não se arrasta em lamúrias, não procura explicações para a sua desgraça, não deita culpas pecaminosas sobre alguém. Espera apenas palavras orientadoras e mãos compassivas que possam acrescentar algo aos seus olhos apagados. É um homem sem voz e sem nome, que deixa os dedos do Mestre enchê-lo de lodo e de beijos, modelando nele os olhos do homem novo. É alguém que confia de olhos fechados, que deixa a voz do Verbo acariciar-lhe a vida, e que permite à “luz da luz” rasgar-lhe a noite interior. Ainda de os olhos vazios, acende-se no seu íntimo uma esperança que o põe a caminho. Junto da piscina associará, pela primeira vez, as vozes e rumores aos rostos e imagens que nunca tinha visto. Depois procurará aquele homem, Filho de Deus, o “Senhor” com voz de primavera, capaz de gestos renovadores e criadores de mais vida.


A cegueira de tantos olhares

Quem estava antes na periferia da vida é agora o centro das atenções. Um carrossel de cegos gira à volta da sua história à procura das areias que atrasam a vida, sem tirar primeiro as próprias traves que impedem ver o milagre. Os fariseus, face à alegria de um pobre, não batem palmas nem se comovem; sabem teorias mas esquecem a vida; edificam um mundo de palavras mas não falam de esperança, nem a fazem desabrochar. Ontem como hoje, o nosso mundo procura explicações e quem errou, mas poucos sentem dor pelos olhos desabitados dos cegos, poucos se deixam encantar pelos novos olhares iluminados. Tornamo-nos burocratas das ideias e analfabetos do coração; somos defensores de doutrinas mas indiferentes à dor; somos crentes sem coração e não vemos as pessoas e os sinais que Deus realiza (Ronchi). Jesus mostra o coração de um Deus que não procura a culpa, nem busca uma justificação para a doença. Ele é a compaixão, a mão viva que toca o coração, o arco-íris que conduz ao um mundo novo. Contudo, enquanto o Senhor ungia e curava o cego, abria também secretamente os olhos de outros cegos e limpava-lhes a cegueira do seu coração (S. Efrém). No fim, o cego torna-se discípulo, de olhos enamorados e coração aberto. Agora, diante de todos, é ele que dialoga, contagia e testemunha os prodígios que Deus realiza nele. Isso, caros amigos, é Evangelho!


VIVER A PALAVRA

Em cada um dos meus olhares, quero colocar a lente da fé.


REZAR A PALAVRA

Senhor...

Sou eu... aquele que encontras cego, no caminho poeirento e escuro.

Sou eu... aquele que carece de purificação na piscina do Teu Espírito.

Sou eu... aquele que mendigo a felicidade e a liberdade no amor.

Sou eu... aquele que curas com a terra fecunda e a água da vida.

Sou eu... aquele que acredita, vê e escuta: Sou Eu quem está a falar contigo!

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