Naquele tempo, Jesus ensinava a
multidão, dizendo: «Acautelai-vos dos escribas, que gostam de exibir longas
vestes, de receber cumprimentos nas praças, de ocupar os primeiros assentos nas
sinagogas e os primeiros lugares nos banquetes. Devoram as casas das viúvas, com
pretexto de fazerem longas rezas. Estes receberão uma sentença mais severa». Jesus
sentou-Se em frente da arca do tesouro a observar como a multidão deitava o
dinheiro na caixa. Muitos ricos deitavam quantias avultadas. Veio uma pobre
viúva e deitou duas pequenas moedas, isto é, um quadrante. Jesus chamou os
discípulos e disse-lhes: «Em verdade vos digo: Esta pobre viúva deitou na caixa
mais do que todos os outros. Eles deitaram do que lhes sobrava, mas ela, na sua
pobreza, ofereceu tudo o que tinha, tudo o que possuía para viver».
O Evangelho deste Domingo
presenteia-nos dois quadros contrastantes que realisticamente ilustram modos
distintos de apreender e se relacionar com Deus. De que lado estamos? Esta
descoberta é um desafio.
Quem te avisa…
Perante
o aviso de Jesus, com que o texto começa, podemos pensar: se ele diz
“acautelai-vos” estará a advertir para algo que vem de fora, para o qual me
devo precaver. Uma análise mais séria leva a adentrar-me pelas avenidas do meu
ser e a descobrir esse escriba enterrado nas minhas motivações. Não será esse
escriba o responsável por destabilizar a minha humildade e verdade face aos
outros? Talvez seja ele o que coloca um verniz à frente da minha falta de
autenticidade; talvez seja ele a ditar-me certas regras de competição
desenfreada, de busca de atenções, de defesa dos “meus direitos”, de uma implacável
indiferença perante os detalhes do irmão. Urge, então, localizar e denunciar
esse escriba… E esse escriba provavelmente sou eu!
Não tenho
hipótese de ludibriar Deus com a soma avultada do meu trabalho pelo seu Reino,
com a incontável lista das minhas obras de piedade, com a sobra de palavras...
Deus não se suborna com esmolas. O desafio que Jesus me deixa é o de converter
a minha vida interior, num manancial a fundo perdido...
Veio
uma pobre viúva
Mas a
viúva pobre também nos vem causar problemas. Primeiro: que estranho este Deus que
se compraz nos pobres, que simpatiza com os fracos! Teremos de passar pela
penúria para que Ele se interesse por nós? Segundo: como pode ser elogiada a
tremenda imprudência desta mulher que dá tudo o que tem? Ela vai agravar a
crise humanitária, é mais uma na conta dos que têm de ser socorridos pela assistência
social…
Há aqui qualquer
cumplicidade entre ela e Deus que, à primeira, nos escapa. A nossa lógica é a
independência… face a Deus e face ao outro. Não toleramos pensar que somos
indigentes, que, de algum modo, dependemos dos outros, ainda que o Outro seja
Deus. Gostamos muito mais de ser nós a dar esmolas, a mostrar, a ostentar… a
deixar um débito na conta do outro e cobrar-lhe juros quando se proporcionar.
No fundo batemos sempre na mesma tecla: queremos colocar-nos no lugar de Deus. A
pergunta que temos de fazer é esta: qual é o nosso Deus? Ou seja, para onde
encaminhamos a nossa confiança?
O que é dar?
Os ricos
davam, a viúva deu? Na verdade, nós nunca damos nada. Tudo o que nos passa
pelas mãos é pura gratuidade de Deus. Vivemos num ambiente em que tudo é (de) graça.
Não se trata de deixar de lado o nosso esforço, nem de enveredar pela atitude
passiva de quem acha que tudo se resolve por si. Trata-se de deixar fluir pelas
nossas mãos a incomensurável riqueza de Deus que é nossa, mas é d’Ele. Trata-se
de lhe dizer: confio em ti, e entrego-te aquilo que de ti recebo, o que tenho e
sou; é na tua presença que me abrigo, é sob o teu horizonte que sonho, é da tua
vida que me alimento é para o teu rosto que caminho.
Amigos e
amigas, a viúva pobre é um perfeito ícone da nossa condição perante Deus. É
pobre de bens e é viúva… pobre de relações. Ela é a expressão de uma pura
dependência de Deus. Porque é Ele o sustentáculo das coisas que fruímos e das
pessoas que amamos. É Ele Quem dá valor aos bens, e a beleza a tudo o que é
belo. Só n’Ele integramos a profundidade e a verdade de nos amarmos. É Ele o
único pelo qual podemos aferir a nossa gestão de bens e de relações. A oferta da
viúva é tudo o que tem para viver, é a sua vida e ela manifesta um percurso
claro para a sua vida: vem de Deus, vai para Deus, pois está em Deus. E isto porque…
verdadeiramente tudo o que possuímos para viver é Deus. E isto é Evangelho!
VIVER
A PALAVRA
Vou
encontrar e praticar novas formas de humildade e de entrega total e
incondicional, ao jeito de Jesus.
REZAR
A PALAVRA
Senhor, no encontro de um sentir, na descoberta do Teu sonho para mim,
construo a minha entrega como resposta ousada de um crer, de um
ofertar.
Quero oferecer-Te a minha vida; tudo o que sou, sinto e tenho é
para Ti.
Cala os longos discursos do meu saber. Desfaz as convencidas
teorias do meu
pensar. Desmorona as supostas certezas do meu agir. Anseio
apenas
oferecer-me a Ti, confiar em Ti, crer em Ti, entregar-Te a minha
vida.
Não quero, Senhor, dar-Te do que me sobra, mas desejo em tudo,
dar-me a Ti!
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