quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

IV Domingo Comum C




Naquele tempo, Jesus começou a falar na sinagoga de Nazaré, dizendo: «Cumpriu-se hoje mesmo esta passagem da Escritura que acabais de ouvir». Todos davam testemunho em seu favor e se admiravam das palavras cheias de graça que saíam da sua boca. E perguntavam: «Não é este o filho de José?». Jesus disse-lhes: «Por certo Me citareis o ditado: ‘Médico, cura-te a ti mesmo’. Faz também aqui na tua terra o que ouvimos dizer que fizeste em Cafarnaum». E acrescentou: «Em verdade vos digo: Nenhum profeta é bem recebido na sua terra. Em verdade vos digo que havia em Israel muitas viúvas no tempo do profeta Elias, quando o céu se fechou durante três anos e seis meses e houve uma grande fome em toda a terra; contudo, Elias não foi enviado a nenhuma delas, mas a uma viúva de Sarepta, na região da Sidónia. Havia em Israel muitos leprosos no tempo do profeta Eliseu; contudo, nenhum deles foi curado, mas apenas o sírio Naamã». Ao ouvirem estas palavras, todos ficaram furiosos na sinagoga. Levantaram-se, expulsaram Jesus da cidade e levaram-n’O até ao cimo da colina sobre a qual a cidade estava edificada, a fim de O precipitarem dali abaixo. Mas Jesus, passando pelo meio deles, seguiu o seu caminho.

Caros amigos e amigas, no Evangelho de hoje os habitantes de Nazaré passam facilmente do orgulho por aquele filho da terra emprestado ao mundo para a irritação e rejeição provocadas pelas suas palavras. Como muda rapidamente o coração da gente! Como é frágil e esquecida a fé!

“Não é este o filho de José?”
Naquele dia, a fama do jovem pregador chamara a atenção da aldeia. Mas, aos poucos, a admiração dá lugar à fúria, a maravilha à indignação. Mas quem pensa ser o filho do carpinteiro e de Maria? Como ousa propor como modelos de fé pessoas estrangeiras e pagãs? Poderá Deus ser melhor acolhido por viúvas e leprosos? Continua, ainda hoje, a tentação de aprisionar Deus no perímetro das nossas igrejas, de fechá-lo no gueto das nossas certezas e tradições. Contudo, Deus persiste em visitar as nossas Nazarés e nós ficamos escandalizados quando vemos que o Evangelho está confiado a tantas mãos frágeis e vidas de barro. Parece-nos inadmissível que Deus se faça pobre, simples, conhecido no dia-a-dia; é intolerável que fale através de alguém que não é sacerdote ou escriba instruído; é inaceitável que tenha as mãos marcadas pelo cansaço! Mas, na verdade, Deus não se serve de gente extraordinária, mas a sua presença imprevisível está no próximo, irmão, amigo ou estrangeiro. A palavra de Deus é declinada em palavras e vidas humanas, porque cada pessoa é profeta e mensageiro do infinito.

“Ninguém é profeta na sua terra”
Como os habitantes de Nazaré também nós deitamos fora os profetas, dissipamos os encantos de Deus, impedimos o esplendor da epifania do quotidiano, nivelamos tudo por baixo. E exigimos espectaculares aparições e prodígios, como os que se realizam na terra estrangeira.
Insistimos em não reconhecer os profetas de hoje, dos que moram junto da nossa porta. Não nos encantamos com a avalanche de milagres que acontecem diariamente, nem nos maravilhamos com os enormes gestos de gratidão, de perdão, de solidariedade, de profetas humildes de rosto concreto. Pelo contrário, temos ciúmes dos ritos da amizade e do amor quando estes não acontecem na nossa vida. Sentimos um fundo de ciúme, sinal da mordidela da serpente das origens, ciumenta dos dons de Deus. Ciúmes de morte como os de Caim pelo dom de Abel. E da inveja dos irmãos de José pela sua sabedoria e pela ternura particular do seu pai. Ciúmes que nos levam a expulsar Deus da cidade da nossa vida e a precipitá-lo no vazio do esquecimento.

“Jesus, passando pelo meio deles, seguiu o seu caminho”
Seduz-me este Jesus livre que segue o seu caminho, porque o amor de Deus é livre e contraria os egoísmos. Encanta-me um Deus sem guetos nem fronteiras, que segue estradas inusuais e caminhos imprevistos. Fascina-me este nomadismo no Espírito, porque a pátria de Jesus é o mundo e, no seu Reino, o outro é sempre a terra prometida! De facto, a vida e a fé não mudam por causa dos milagres, mas pelos prodígios de um amor livre que nunca se rende.
A Deus não se trava nem se bloqueia, não se encaixilha num quadro como uma fotografia, nem se arruma como uma pagela no meio dum livro. Deus é mais vasto e grande do que os nossos pequenos horizontes pessoais! E só um dia, mais tarde, compreenderemos que toda a potência de Deus se manifestará na impotência da cruz. Ali veremos, caros amigos e amigas, a evidência do Evangelho!

VIVER A PALAVRA
Vou procurar conhecer melhor o irmão, para melhor acolher!

REZAR A PALAVRA
Senhor, a rotina de um conhecer superficial ofusca o brilho do caminho
e distancia-me da meta que busco e ousei um dia sonhar. Senhor, a falta
de novidade na minha adesão a ti, arrefece o fogo da fé e a certeza do mistério
do amor que um dia me fascinou. Senhor, abana as débeis certezas da minha lógica
e confunde a ténue inteligência do meu saber. Quero um coração vazio
 de palavras feitas e sedento da tua verdade, para te acolher. Vem!

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

III Domingo Comum C




Já que muitos empreenderam narrar os factos que se realizaram entre nós, como no-los transmitiram os que, desde o início, foram testemunhas oculares e ministros da palavra, também eu resolvi, depois de ter investigado cuidadosamente tudo desde as origens, escrevê-las para ti, ilustre Teófilo, para que tenhas conhecimento seguro do que te foi ensinado. Naquele tempo, Jesus voltou da Galileia, com a força do Espírito, e a sua fama propagou-se por toda a região. Ensinava nas sinagogas e era elogiado por todos. Foi então a Nazaré, onde Se tinha criado. Segundo o seu costume, entrou na sinagoga a um sábado e levantou-Se para fazer a leitura. Entregaram-Lhe o livro do profeta Isaías e, ao abrir o livro, encontrou a passagem em que estava escrito: «O Espírito do Senhor está sobre mim, porque Ele me ungiu para anunciar a Boa Nova aos pobres. Ele me enviou a proclamar a redenção aos cativos e a vista aos cegos, a restituir a liberdade aos oprimidos e a proclamar o ano da graça do Senhor». Depois enrolou o livro, entregou-o ao ajudante e sentou-Se. Estavam fixos em Jesus os olhos de toda a sinagoga. Começou então a dizer-lhes: «Cumpriu-se hoje mesmo esta passagem da Escritura que acabais de ouvir».

Caros amigos e amigas, na sinagoga de Nazaré, Jesus realiza a palavra de Deus. Ele é o grande narrador que “diz” Deus. Ele é a linguagem de Deus, o seu Verbo! Ler, hoje, o Evangelho é meter-se no meio de uma história, a história de Jesus, para continuar esta narração com a própria vida.

“Para ti, ilustre Teófilo”
Lucas dedica-nos o seu Evangelho. E chama-nos Teófilo (= “amigo de Deus”)! Um nome que ainda ninguém tinha sonhado dar-nos: “Amado por Deus”! Teófilo representa todos aqueles que, em qualquer lugar e em qualquer tempo, procuram apaixonadamente a Deus.
Além disso, Lucas afirma que investigou cuidadosamente para que tivéssemos um conhecimento seguro sobre Jesus. Este não é um produto da fantasia, imaginação ou ideologia. Jesus viveu num lugar e num tempo concreto. O Evangelho não é uma recolha de “pílulas de sabedoria” para viver melhor, nem um amontoado de histórias épicas, nem um livro de histórias sagradas. O Evangelho é a história de um encontro, de uma experiência, de um amor, de um sonho realizado: o de Deus e o teu!

Deus nos caminhos de Nazaré
Jesus é o sonho de Deus realizado! Em Nazaré fecham-se os livros e abre-se a vida, passa-se do papel ao respiro, das profecias à realização.
Com Jesus é toda uma nova génese que inicia. É um amor encantado pelos pobres, opção pelos cegos, preferência pelos oprimidos. Os excluídos e os esfomeados de amor são hoje os primeiros destinatários deste novo reino.
Também eu me encontro naquela Sinagoga de Nazaré, com os olhos fixos em Jesus e com os ouvidos atentos àquela Palavra que ecoa! E aquele jovem nazareno não narra, mas vive. Não recorda as palavras do profeta Isaías, mas actualiza-as. Não diz palavras vazias, mas realiza-as. Ele é o sonho e a paixão de Deus à minha procura, pelos caminhos da vida.

“Cumpriu-se hoje mesmo”
Deus fala sempre no presente. O Evangelho não está escondido na poeira dos séculos passados, nem na utopia doentia de um futuro distante. É uma Palavra viva e actual. É o hoje extraordinário da humanidade que se encontra com Deus.
Este hoje também se dirige a mim. Somos contemporâneos de Deus! No hoje da nossa vida ressoa ainda aquela voz que quer remover as cinzas que nos oprimem. O Evangelho Jesus é um permanente convite à alegria. Não é a memória de um livro! É o milagre de uma voz que sempre espera a minha escuta para dar frutos de vida nova.
O Evangelho reclama outros evangelhos: quem escuta é transformado por aquilo que escuta; e assim a Palavra do papel se transforma em Palavra viva. Caro amigo, cara amiga, hoje, tu és semente de Evangelho!

VIVER A PALAVRA
Vou cultivar uma atenção permanente para ler Deus no hoje da minha vida e tornar-me seu anúncio.

REZAR A PALAVRA
Senhor, abre-me os olhos, o entendimento para reconhecer as palavras que te revelam; que repare na eloquência da beleza que esbanjas à minha frente e que, às vezes, desperdiço.
Que nada perca de tudo o que que me dás, e beba do sopro dos teus lábios a esperança.
Senhor Deus, que cuidas dos fracos e dos pobres, reescreve a Tua Palavra na minha vida,
 faz-me intérprete do Teu amor, prodígio da Tua misericórdia, sacramento da tua Presença.
Faz-me, Senhor, semente de Evangelho!

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

domingo, 20 de janeiro de 2013

Jornadas Bíblicas JEF


No dia 19 de janeiro, reuniram 31 jovens JEF no âmbito das Jornadas Bíblicas. Dando continuidade ao Plano Pastoral, o tema trabalhado foi: A missão na Bíblia.
Após a oração da manhã, que convidava a um momento de interiorização para nos "desenharmos" e deixarmos desenhar por Deus, tivemos um pequeno tempo de formação sobre a constituição da Bíblia e a sua consulta. Seguiu-se uma dinâmica sobre o chamamento e posteriormente a Irmã Emília Seixas orientou um trabalho de grupo sobre a Missão no Antigo Testamento. Após este trabalho completámos um painel com as passagens bíblicas trabalhadas e palavras chave das mesmas.
Depois da partilha de farnéis, iniciámos a tarde com o jogo de Dominó Bíblico, onde fizemos corresponder os livros da Bíblia consoante o grupo onde se encontram. Terminado o jogo, a Irmã Conceição trabalhou o tema da Missão no Novo Testamento que concluiu com o jogo do Loto, onde estavam referidas as personagens bíblicas relacionadas com a missão de Jesus e o preenchimento do painel com palavras sobre a Missão no Novo Testamento.
Terminou o encontro com a distribuição dos "prémios" aos jovens corajosos que integraram este "filme" sobre a Missão na Bíblia ao qual se seguiu um tempo de oração de envio em Missão.
Conhecemos e explorámos a Missão na Bíblia, é agora tempo de refletirmos a nossa missão...!














quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

II Domingo Comum C




Naquele tempo, realizou-se um casamento em Caná da Galileia e estava lá a Mãe de Jesus. Jesus e os seus discípulos foram também convidados para o casamento. A certa altura faltou o vinho. Então a Mãe de Jesus disse-Lhe: «Não têm vinho». Jesus respondeu-Lhe: «Mulher, que temos nós com isso? Ainda não chegou a minha hora». Sua Mãe disse aos serventes: «Fazei tudo o que Ele vos disser». Havia ali seis talhas de pedra, destinadas à purificação dos judeus, levando cada uma de duas a três medidas. Disse-lhes Jesus: «Enchei essas talhas de água». Eles encheram-nas até acima. Depois disse-lhes: «Tirai agora e levai ao chefe de mesa». E eles levaram. Quando o chefe de mesa provou a água transformada em vinho, - ele não sabia de onde viera, pois só os serventes, que tinham tirado a água, sabiam - chamou o noivo e disse-lhe: «Toda a gente serve primeiro o vinho bom e, depois de os convidados terem bebido bem, serve o inferior. Mas tu guardaste o vinho bom até agora». Foi assim que, em Caná da Galileia, Jesus deu início aos seus milagres. Manifestou a sua glória e os discípulos acreditaram n’Ele.

Caros amigos e amigas, neste relato conhecido das bodas de Caná aparece em filigrana a narração dum outro matrimónio: o matrimónio de Deus com a humanidade; a união onde o esposo é Jesus, autor da alegria e do amor, e a esposa é a Igreja. Nas bodas de Cana está representada a nossa relação com Deus, como uma relação nupcial, amorosa, festiva e recíproca.

Vasos estalados e vazios
Também é assim connosco: nem sempre o sorriso que cobre os lábios representa a alegria do coração. Até as experiências mais festivas podem ser assinaladas por uma ausência, uma tristeza, o anoitecer. Tantas vezes, a nossa existência é como aquelas seis talhas de pedra: uma enormidade arqueológica vazia! Tanta imponência de fachada, mas desprovidas de conteúdo. Quantas relações cansadas e aguadas que não provocam felicidade, que não são festa…
A ausência de vinho e aquelas talhas são sinal de um coração de pedra que não se deixa envolver pelas solicitações do amor. Contudo, é destas talhas que Jesus se serve para realizar o primeiro dos sinais. É a partir da nossa vida e na nossa vida que os milagres acontecem.

«Fazei tudo o que Ele vos disser»
Maria é sempre uma presença discreta mas atenta. Maria não se resigna. Como também Deus nunca se resigna! É possível recomeçar! É possível colocar nas mãos de Deus a insipiência da nossa água. Em Caná é a nossa vida que é mudada, dando-lhe um sabor forte, um sabor de vida eterna, de felicidade.
“Fazei o que Jesus diz”! Estas últimas palavras de Maria, no evangelho de João, são quase um testamento de amor para todos os filhos. Fazei! Não basta escutar ou anunciar, é preciso fazer, tornar vivo o Evangelho. É possível encher as vasilhas vazias com palavras que falam ao coração, com aquilo que Jesus nos diz com uma Palavra que transforma e transfigura a vida.

O amor festivo de Deus
É consolador ver Maria e Jesus atentos para que nada falte à alegria das pessoas. Atentos não apenas aos dramas, às dores, às doenças, mas também à festa daqueles irmãos de vasos vazios. Preocupados para que não se apague a festa da vida, mas desabroche e multiplique o néctar da felicidade.
Em Caná nada há de meritório; apenas a pobreza do vinho e a aridez do coração. Os esposos nada fazem para merecer o milagre, mas Deus preocupado com a felicidade intervém, indiferente aos méritos, defeitos ou virtudes. E este é o Deus em que acredito: o Deus das bodas de Caná, o Deus da festa, do amor que dança, um Deus feliz que faz do amor o lugar onde brotam milagres, um Deus alegre que dá vontade de existir e de acreditar (E. Ronchi). Esse, caros amigos e amigas, é o prodígio do Evangelho!

VIVER A PALAVRA
Vou fazer o que Jesus me diz, no segredo do coração, em cada gesto do quotidiano.


REZAR A PALAVRA
Senhor, de coração tenso, no colorido da vida que dói e desabrocha em cada sim,
coloco a minha talha aos teus cuidados. Fendida, e frágil, vazia de amor,
aspira ao que a preenche, à festa do teu toque, ao perfume do teu estar,
à ternura do tua Palavra, à beleza do teu canto que me abraça e me dá vida.
Senhor, de coração em festa, neste misterioso laço que me atrai,
anseio acreditar sempre mais e provar a deliciosa essência do teu amor por mim!

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Batismo do Senhor - C



Naquele tempo, o povo estava na expectativa e todos pensavam em seus corações se João não seria o Messias. João tomou a palavra e disse-lhes: «Eu baptizo-vos com água, mas vai chegar quem é mais forte do que eu, do qual não sou digno de desatar as correias das sandálias. Ele baptizar-vos-á com o Espírito Santo e com o fogo». Quando todo o povo recebeu o baptismo, Jesus também foi baptizado; e, enquanto orava, o céu abriu-se e o Espírito Santo desceu sobre Ele em forma corporal, como uma pomba. E do céu fez-se ouvir uma voz: «Tu és o meu Filho muito amado: em Ti pus toda a minha complacência.»

Caros amigos e amigas, às vezes vivemos os tempos litúrgicos como compartimentos estanques e fechados. Mas ser baptizado é permanecer em Advento, é viver em expectante e operosa abertura à voz de Deus.

Estando o povo na expectativa
Parece que as repetições nos cansam e entopem a fluência da nossa entrega, parece que a rotina nos embaça a vista e mecaniza friamente os ritos. Mas não, o que nos cansa e torna frios é o teimoso desencontro dos nossos caminhos com os caminhos do Senhor que vem ao nosso encontro. Quando a nossa rota não coincide com a d’Ele. Precisamos de continuar em Advento. A expectativa mantém-nos acordados. Todo o tempo é de expectativa. A qualquer momento o céu se pode abrir, a qualquer instante Deus pode manifestar-nos um amor que nos surpreende no meio da nossa aridez. Não corramos o risco de perder tal graça!
João Baptista resiste à tentação de um protagonismo fácil, mas falacioso; ele continua a desafiar-nos à verdade e à humildade, àquele estado de nudez que nos deixa preparados para receber as surpresas de Deus. É grande a tentação de nos ornamentar, nem que seja com a imagem dos outros e isso bloqueia-nos e bloqueia o caminho do dom. A ilusão não compensa, devora-nos.

O céu abriu-se
A oração de Jesus é como uma ponte, uma escada. Há uma palavra humana que sobe e há uma resposta divina que desce. A oração do humilde é perfurante (Cfr. Sir 35, 17), ela fende o céu e esventra as suas riquezas. Neste cenário abre-se o céu, como quando a lança abriu o coração de Jesus e dele saiu sangue e água. Recordemos de quantos episódios de abertura está recheada a Bíblia. As aberturas que Deus faz são sempre incisões no seu próprio coração, porque o céu é o coração de Deus, e dele apenas pode manar o seu amor.
E aqui está! Jesus golpeia o céu e dele escorre o Espírito Santo com uma declaração de amor. Esta cena faz-nos compreender o teor do baptismo. É essencialmente uma chuva do amor de Deus. O Espírito mantém o movimento daquela água da Criação (Gn 1, 1) da qual tudo brota, na qual tudo recebe fecundidade. Então, queridos amigos e amigas, ser baptizado é aceitar ser (re)criado a partir do amor, é aceitar este lume vivo dos céus, deixar-se permanecer num Pentecostes aceso. É esperar que tudo o que nos é essencial venha do Céu, mas... num operoso esforço por tornar-se Céu de Deus.

Filhos no Filho
Comove-me este misturar-se de Jesus com o povo que procura lavar-se do pecado. Ele assume o nosso pecado. Mas ao fazer-se um de nós, Ele é também a nossa referência. Ele é o Filho que nos ensina e nos faz aceder à divina filiação. Com a d’Ele, a nossa voz humana pode voar, cortar as nuvens e perfurar o céu, e é também com Ele que a nossa humanidade recebe aquela exultante declaração de amor. No texto, Lucas não diz para quem foi dirigida a Palavra da voz, talvez para nos deixar perceber que a declaração de amor também nos é endereçada, chuva fecundante sobre a nossa fragilidade, medos e até maldades. Se Deus já nos amava, quanto mais agora que descortina na nossa humanidade a imagem do seu Filho dilecto!
Amigos e amigas… há aberturas que nós também podemos fazer, há pontes que podemos estabelecer. Cada um de nós também pode abrir o Céu ao irmão. E esta abertura pode ser feita por palavras, mas pode ser apenas através de um operativo silêncio, de um indesmentível gesto de bondade, de um socorro desinteressado, pode ser o fender de um sorriso, a partilha de uma missão. Nós temos ao nosso alcance o segredo para os maiores milagres, quando conseguimos olhar o outro, com sincero encanto, e declarar-lhe: “Tu és amado, tu és amada!” E nesta declaração está contida toda a doçura do Evangelho.

VIVER A PALAVRA
Vou abrir o meu coração ao outro para ter a coragem de dizer: amo-te!

REZAR A PALAVRA
Senhor, de ténue esperança e persistente ansiedade, pinto cada página da minha busca.
Nas manchas entranhadas do pecado em mim, há um grito que me lança para ti, no desejo da purificação e da liberdade do sentir. Só o teu abraço me faz digno de ser teu,
só o fogo do teu Espírito me ensina a orar, a escutar, a estar contigo.
Em ti descubro as cores desafiantes do amor, da entrega, da abertura aos outros.
Preciso olhar o céu e escutar de coração aberto: Tu és meu filho muito amado!

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Epifania do Senhor - C




Tinha Jesus nascido em Belém da Judeia, nos dias do rei Herodes, quando chegaram a Jerusalém uns Magos vindos do Oriente. «Onde está – perguntaram eles – o rei dos judeus que acaba de nascer? Nós vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-l’O». Ao ouvir tal notícia, o rei Herodes ficou perturbado e, com ele, toda a cidade de Jerusalém. Reuniu todos os príncipes dos sacerdotes e escribas do povo e perguntou-lhes onde devia nascer o Messias. Eles responderam: «Em Belém da Judeia, porque assim está escrito pelo Profeta: ‘Tu, Belém, terra de Judá, não és de modo nenhum a menor  entre as principais cidades de Judá, pois de ti sairá um chefe, que será o Pastor de Israel, meu povo’». Então Herodes mandou chamar secretamente os Magos e pediu-lhes informações precisas sobre o tempo em que lhes tinha aparecido a estrela. Depois enviou-os a Belém e disse-lhes: «Ide informar-vos cuidadosamente acerca do Menino; e, quando O encontrardes, avisai-me, para que também eu vá adorá-l’O». Ouvido o rei, puseram-se a caminho. E eis que a estrela que tinham visto no Oriente seguia à sua frente e parou sobre o lugar onde estava o Menino. Ao ver a estrela, sentiram grande alegria. Entraram na casa, viram o Menino com Maria, sua Mãe, e, prostrando-se diante d’Ele, adoraram-n’O. Depois, abrindo os seus tesouros, ofereceram-Lhe presentes: ouro, incenso e mirra. E, avisados em sonhos para não voltarem à presença de Herodes, regressaram à sua terra por outro caminho.

Caros amigos e amigas Deus manifesta-se. A verdadeira sabedoria está em aplicar-se a procura-l’O para O adorar.

«Onde está o rei?»
No meio da anarquia que se faz sentir, não tanto no âmbito público, mas mais nas circunscrições domésticas do nosso interior, soa a pergunta: «onde está o rei?». Há sinais que O anunciam! E, o principal sinal, a verdadeira estrela, tantas vezes matinal, é a nossa perturbação. A perturbação de quem se sente ameaçado pelas falsas realezas. A perturbação de quem já não se ilude com o poder próprio. A perturbação de quem só se saberá descansado quando encontrar Deus, o verdadeiro Rei. A perturbação que traz grande alegria aos atentos.
«Onde está o Rei?» perguntam também, hoje, os sábios do nosso tempo quando indagam por Deus e O procuram de coração sincero. «Onde está o Rei?» perguntas tu, caro leitor, se O desejas a reinar nas tuas decisões, na tua vontade, na tua vida.

Viram o Menino e adoraram-n’O
Aos olhos que procuram, anteciparam-se os olhos procurados. Porque Deus quis ver com olhos de menino para que O vissem e O reconhecessem. Já antes se deixara divisar na voz dos profetas, mas agora mostra-se numa casa, ao lado duma Mãe, na fragilidade dum Menino. Ao vê-l’O, os Magos prostraram-se e adoraram-n’O primeiramente. Impunha-se que antes de oferecerem fosse o que fosse, se oferecessem a si mesmos. Neste atuar, os sábios do Oriente dão-nos o segredo para o nosso relacionamento com Deus. Há que enveredar pelo caminho da procura; há que seguir os sinais; há que deixar para trás os preconceitos; há que estar disponível para as surpresas de Deus; há que deixar-se ver, para O reconhecer pelo olhar; há que fazer a oblação de nós mesmos; há que seguir, no fim, por outro caminho.

Regressaram por outro caminho
Converter-se é mudar de rota. É o que fazem ainda hoje os sábios, que não moram necessariamente nos laboratórios das universidades, nas assinaturas dos best-sellers, nas casas do poder ou nos contratos milionários. Os sábios, se aí moram, é porque desses lugares fizeram o caminho da procura da Verdade e do encontro com Deus. E é o que basta para continuar por outro caminho. A conversão do coração passa pelo encontro com Deus, que se mostra em Jesus. É n’Ele que, como S. Paulo, vemos o Mistério revelado. O mistério de uma terra que não é de modo nenhum a menor, porque é engrandecida por Deus.
E aqui está a sabedoria! Deixar-se engrandecer pelo Deus que se faz peregrino com o homem, ao longo da sua história, para que o seu caminho seja sempre outro e a sua meta sempre o outro no Outro. Sim, porque só veremos bem os nossos contemporâneos quando os virmos iluminados pelo Deus que nos nasce e nos faz nascer com outro olhar. E isto, caros amigos e amigas, é Evangelho.


VIVER A PALAVRA
Quero que as minhas correrias do dia a dia, tenham como única meta o único Rei.

REZAR A PALAVRA
Senhor, Rei do meu coração, reconheço que nem sempre te dou a primazia na minha vida.
Reconheço as vezes em que os meus olhos se distraem, por horizontes onde sou eu o centro,
 as vezes em que os meus olhos se perdem em fogos fátuos, que não iluminam,
nem aquecem. E a Ti que quero procurar, Deus que tão solícito me procuras;
é a ti que quero confiar o ardor das minhas peregrinações.
A Ti quero dar o meu coração, a Ti que já o proveste de riquezas!

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Felizes os obreiros da paz




MENSAGEM DE SUA SANTIDADE
BENTO XVI
PARA A CELEBRAÇÃO DO
XLVI DIA MUNDIAL DA PAZ
1 DE JANEIRO DE 2013

BEM-AVENTURADOS OS OBREIROS DA PAZ
1. Cada ano novo traz consigo a expectativa de um mundo melhor. Nesta perspectiva, peço a Deus, Pai da humanidade, que nos conceda a concórdia e a paz a fim de que possam tornar-se realidade, para todos, as aspirações duma vida feliz e próspera.
Na realidade o nosso tempo, caracterizado pela globalização, com seus aspectos positivos e negativos, e também por sangrentos conflitos ainda em curso e por ameaças de guerra, requer um renovado e concorde empenho na busca do bem comum, do desenvolvimento de todo o homem e do homem todo.
E no entanto as inúmeras obras de paz, de que é rico o mundo, testemunham a vocação natural da humanidade à paz. Em cada pessoa, o desejo de paz é uma aspiração essencial e coincide, de certo modo, com o anelo por uma vida humana plena, feliz e bem sucedida. Por outras palavras, o desejo de paz corresponde a um princípio moral fundamental, ou seja, ao dever-direito de um desenvolvimento integral, social, comunitário, e isto faz parte dos desígnios que Deus tem para o homem. Na verdade, o homem é feito para a paz, que é dom de Deus.

A bem-aventurança evangélica
2. A bem-aventurança de Jesus diz que a paz é, simultaneamente, dom messiânico e obra humana. Na verdade, a paz pressupõe um humanismo aberto à transcendência; é fruto do dom recíproco, de um mútuo enriquecimento, graças ao dom que provém de Deus e nos permite viver com os outros e para os outros.

A paz: dom de Deus e obra do homem
3. A realização da paz depende sobretudo do reconhecimento de que somos, em Deus, uma úni­ca família humana.
A paz não é um sonho, nem uma utopia; a paz é possível. Os nossos olhos devem ver em profundidade, sob a superfície das aparências e dos fenómenos, para vislumbrar uma realidade positiva que existe nos corações, pois cada homem é criado à imagem de Deus e chamado a crescer contribuindo para a edificação dum mundo novo.
Na realidade, Jesus é a nossa paz, a nossa justiça, a nossa reconciliação (cf. Ef 2, 14; 2 Cor 5, 18). O obreiro da paz, segundo a bem-aventurança de Jesus, é aquele que procura o bem do outro, o bem pleno da alma e do corpo, no tempo presente e na eternidade.
A partir deste ensinamento, pode-se deduzir que cada pessoa e cada comunidade – religiosa, civil, educativa e cultural – é chamada a trabalhar pela paz.

Obreiros da paz são aqueles que amam, defendem e promovem a vida na sua integridade
4. Assim, os verdadeiros obreiros da paz são aqueles que amam, defendem e promovem a vida humana em todas as suas dimensões: pessoal, comunitária e transcendente. A vida em plenitude é o ápice da paz. Quem deseja a paz não pode tolerar atentados e crimes contra a vida.

Educação para uma cultura da paz: o papel da família e das instituições
6. A família é um dos sujeitos sociais indispensáveis para a realização duma cultura da paz.
Na família, nascem e crescem os obreiros da paz, os futuros promotores duma cultura da vida e do amor.

Uma pedagogia do obreiro da paz
7. Com efeito, as obras de paz concorrem para realizar o bem co­mum e criam o interesse pela paz, educando para ela. Pensamentos, palavras e gestos de paz criam uma mentalidade e uma cultura da paz, uma atmos­fera de respeito, honestidade e cordialidade. Por isso, é necessário ensinar os homens a amarem-se e educarem-se para a paz, a viverem mais de benevolência que de mera tolerância. Incentivo fundamental será « dizer não à vingança, reconhecer os próprios erros, aceitar as desculpas sem as buscar e, finalmente, perdoar », de modo que os erros e as ofensas possam ser verdadeiramente reconhecidos a fim de caminhar juntos para a reconciliação. Isto requer a difusão duma pedagogia do perdão.
Na realidade, o mal vence-se com o bem, e a justiça deve ser procurada imitando a Deus Pai que ama todos os seus filhos (cf. Mt 5, 21-48). É um trabalho lento, porque supõe uma evolução espiritual, uma educação para os valores mais altos, uma visão nova da história humana.
É preciso renunciar à paz falsa, que prometem os ídolos deste mundo, e aos perigos que a acompanham; refiro-me à paz que torna as consciências cada vez mais insensíveis, que leva a fechar-se em si mesmo, a uma existência atrofiada vivida na indiferença. Ao contrário, a pedagogia da paz implica serviço, compaixão, solidariedade, coragem e perseverança.
Jesus encarna o conjunto destas atitudes na sua vida até ao dom total de Si mesmo, até «perder a vida» (cf. Mt 10, 39; Lc 17, 33; Jo 12, 25).

Vaticano, 8 de Dezembro de 2012.

BENEDICTUS PP XVI