Naquele tempo, o povo estava na
expectativa e todos pensavam em seus corações se João não seria o Messias. João
tomou a palavra e disse-lhes: «Eu baptizo-vos com água, mas vai chegar quem é
mais forte do que eu, do qual não sou digno de desatar as correias das
sandálias. Ele baptizar-vos-á com o Espírito Santo e com o fogo». Quando todo o
povo recebeu o baptismo, Jesus também foi baptizado; e, enquanto orava, o céu
abriu-se e o Espírito Santo desceu sobre Ele em forma corporal, como uma pomba.
E do céu fez-se ouvir uma voz: «Tu és o meu Filho muito amado: em Ti pus toda a
minha complacência.»
Caros amigos e amigas, às
vezes vivemos os tempos litúrgicos como compartimentos estanques e fechados. Mas
ser baptizado é permanecer em Advento, é viver em expectante e
operosa abertura à voz de Deus.
Estando
o povo na expectativa
Parece que as
repetições nos cansam e entopem a fluência da nossa entrega, parece que a
rotina nos embaça a vista e mecaniza friamente os ritos. Mas não, o que nos
cansa e torna frios é o teimoso desencontro dos nossos caminhos com os caminhos
do Senhor que vem ao nosso encontro. Quando a nossa rota não coincide com a d’Ele.
Precisamos de continuar em Advento. A expectativa mantém-nos acordados. Todo o
tempo é de expectativa. A qualquer momento o céu se pode abrir, a qualquer
instante Deus pode manifestar-nos um amor que nos surpreende no meio da nossa aridez.
Não corramos o risco de perder tal graça!
João Baptista resiste
à tentação de um protagonismo fácil, mas falacioso; ele continua a desafiar-nos
à verdade e à humildade, àquele estado de nudez que nos deixa preparados para
receber as surpresas de Deus. É grande a tentação de nos ornamentar, nem que
seja com a imagem dos outros e isso bloqueia-nos e bloqueia o caminho do dom. A
ilusão não compensa, devora-nos.
O céu
abriu-se
A oração de Jesus é
como uma ponte, uma escada. Há uma palavra humana que sobe e há uma resposta
divina que desce. A oração do humilde é perfurante (Cfr. Sir 35, 17), ela fende
o céu e esventra as suas riquezas. Neste cenário abre-se o céu, como quando a
lança abriu o coração de Jesus e dele saiu sangue e água. Recordemos de quantos
episódios de abertura está recheada a Bíblia. As aberturas que Deus faz são
sempre incisões no seu próprio coração, porque o
céu é o coração de Deus, e dele apenas pode manar o seu amor.
E aqui está! Jesus golpeia
o céu e dele escorre o Espírito Santo com uma declaração de amor. Esta cena
faz-nos compreender o teor do baptismo. É essencialmente uma chuva do amor de
Deus. O Espírito mantém o movimento daquela água da Criação (Gn 1, 1) da qual
tudo brota, na qual tudo recebe fecundidade. Então, queridos amigos e amigas,
ser baptizado é aceitar ser (re)criado a partir do amor, é aceitar este lume
vivo dos céus, deixar-se permanecer num Pentecostes aceso. É esperar que tudo o
que nos é essencial venha do Céu, mas... num operoso esforço por tornar-se Céu
de Deus.
Filhos no Filho
Comove-me este
misturar-se de Jesus com o povo que procura lavar-se do pecado. Ele assume o
nosso pecado. Mas ao fazer-se um de nós, Ele é também a nossa referência. Ele é
o Filho que nos ensina e nos faz aceder à divina filiação. Com a d’Ele, a nossa
voz humana pode voar, cortar as nuvens e perfurar o céu, e é também com Ele que
a nossa humanidade recebe aquela exultante declaração de amor. No texto, Lucas
não diz para quem foi dirigida a Palavra da voz, talvez para nos deixar perceber
que a declaração de amor também nos é endereçada, chuva fecundante sobre a
nossa fragilidade, medos e até maldades. Se Deus já nos amava, quanto mais
agora que descortina na nossa humanidade a imagem do seu Filho dilecto!
Amigos e amigas… há
aberturas que nós também podemos fazer, há pontes que podemos estabelecer. Cada
um de nós também pode abrir o Céu ao irmão. E esta abertura pode ser feita por
palavras, mas pode ser apenas através de um operativo silêncio, de um
indesmentível gesto de bondade, de um socorro desinteressado, pode ser o fender
de um sorriso, a partilha de uma missão. Nós temos ao nosso alcance o segredo
para os maiores milagres, quando conseguimos olhar o outro, com sincero
encanto, e declarar-lhe: “Tu és amado, tu és amada!” E nesta declaração está
contida toda a doçura do Evangelho.
VIVER
A PALAVRA
Vou abrir o meu coração ao outro para ter a coragem de
dizer: amo-te!
REZAR
A PALAVRA
Senhor,
de ténue esperança e persistente ansiedade, pinto cada página da minha busca.
Nas
manchas entranhadas do pecado em mim, há um grito que me lança para ti, no
desejo da purificação e da liberdade do sentir. Só o teu abraço me faz digno de
ser teu,
só o
fogo do teu Espírito me ensina a orar, a escutar, a estar contigo.
Em ti
descubro as cores desafiantes do amor, da entrega, da abertura aos outros.
Preciso
olhar o céu e escutar de coração aberto: Tu és meu filho muito amado!
Nenhum comentário:
Postar um comentário